Tenho andado em palcos
sem saber as deixas para eu falar,
pelo que vou improvisando a cada silêncio.
Por vezes uso roupas de príncipe
sem princesa à vista
e o ponto grita em surdina para chamá-la.
Nem sempre vem.
Também ando por caminhos
onde me perco sem bússola nem sextante.
A cada entroncamento,
penso 90 graus de cada vez
e acabo a fazer naus obsoletas
com as cascas dos pinheiros hipócritas
que me cercam de elogios
em que ninguém sinceramente navega.
As minhas falas nem sempre são ouvidas,
são mudas que falam a surdos
e acabam por cair angustiadas
em sacos rotos que se amontoam
nos mares dos tempos perdidos,
são lampiões extintos em nevoeiros
e só visíveis com óculos de visão noturna.
Ano novo, vida nova?
Se ao menos tivesse Flora no meu leito
sem que Zéfiro soubesse
ou tivesse uma princesa que guardasse
na sua arca dourada os ecos da minha vida.
Mas tenho sido
um guardador de peixes rebeldes
que fogem da minha nau não sei para onde
e nem vejo os remos que me levem às falas
para acabar com os impensados improvisos.
© Jaime Portela, Dezembro de 2024